“O prejuízo é irreparável e incalculável”, crava promotor; acompanhe todo o processo de investigação ainda em andamento da maior mortandade de peixes na história do Rio Piracicaba

“O prejuízo é irreparável e incalculável.” Esta foi a frase mais emblemática dita pelo promotor de Justiça do Gaema (Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente) do Ministério Público de Piracicaba, Ivan Carneiro Castanheiro, sobre a maior mortandade de peixes no Rio Piracicaba em 7 de julho – provocada, ao que tudo indica, por despejo irregular de resíduos e melaço no ribeirão Tijuco Preto, em Rio das Pedras, a partir da Usina São José, do Grupo Farias. A fala do promotor foi no contexto do principal orador na audiência pública sobre o desastre ambiental, em reunião realizada na Câmara de Vereadores nesta quarta-feira, dia 28, sob o comando da parlamentar Silvia Morales (PV/Mandato Coletivo). 

Uma das principais preocupações de Castanheiro é a de fazer a avaliação de danos ambientais a fim de pedir uma indenização de danos morais e materiais pela degradação da vida aquática, da própria flora do rio e prejuízo aos pescadores – cerca de 200 estão sem conseguir desempenhar sua atividade profissional. Ainda faltam três laudos para embasar a nova ação do Gaema, que já tem inquérito civil instaurado para o caso.

Ivan Castanheiro falou na tribuna da Câmara nesta quarta, dia 28; promotor age com cuidado e deve propor TAC à usina São José
(foto/crédito: O Diário Piracicabano)

A própria usina bem como o Instituto de Criminalística da Polícia Científica do Estado de SP mais a Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) ainda devem apresentar laudos. O caminho a ser seguido é um TAC (Termo de Ajuste de Conduta), mas o promotor do Gaema relata a negativa veemente dos advogados da empresa em reconhecer a culpa pela poluição, mas ficaram de se posicionar quanto a uma remuneração aos pescadores – o Piracicaba deve se recuperar em dois anos ou mais. Também há a preocupação de que o Grupo Farias está com um processo de recuperação judicial – a dívida inicial era de R$ 32 milhões, mas foi reduzida para R$ 9 milhões.

“É um processo [de recuperação judicial] que corre por Pernambuco, com quase 8.000 páginas. Há muitos bens penhorados e essa é uma preocupação forte que temos também em relação a ganhar a indenização. O que já vai ser uma batalha, porque eles negam. E tem alguns elementos para serem rebatidos para esse efetivo ressarcimento. Vamos tentar um Termo de Ajustamento de Conduta com eles assim que arredondar a prova. Não adianta partimos para um acordo sem saber a dimensão do dano. E o próximo passo, por consequência, é um ajustamento, que presume uma irregularidade. Se eles não aceitam fazer isso voluntariamente, a gente vai ter que propor uma ação. E aí eu tenho que saber o que eu vou pedir. Então, não é a hora de chamar para uma negociação final. Embora a gente já tenha tido uma primeira reunião no dia 23, houve uma negativa da empresa veemente [do crime ambiental]. Naquele momento, fiz uma colocação que eu achei bastante importante de ser feita, que era a questão do auxílio emergencial aos pescadores, independentemente do reconhecimento de culpa. E os advogados que fizeram reunião conosco ficaram de fazer uma consulta à diretoria e responder até o final de semana.”

A questão da reparação é um outro objetivo forte do inquérito já instaurado, explica o promotor. “Obviamente, não basta constatar a autoria, não basta constatar o nexo de causalidade, é necessário também que se comprove aí a demonstração de que houve o dano e seja provada a autoria, para então buscar a responsabilização. A responsabilização por quê? Qual o valor do dano? É uma questão que precisa ser apurada e certamente será uma perícia bastante complexa. A avaliação de danos ambientais não é algo simples, é algo bastante polêmico quanto a questão das metodologias. É uma das grandes preocupações que eu tenho. A outra questão é monitorar os trabalhos que estão sendo feitos ao longo deste período e que serão feitos no futuro, bem como acompanhar também as questões relativas à investigação criminal mais a cargo diretamente da Polícia Civil, sabendo também que temos um inquérito instaurado pela Polícia Federal.”

Mas, na análise de Ivan Carneiro Castanheiro, as expectativas são baixas quanto às punições em valores mais altos por conta da atual legislação ambiental e quanto à cassação da licença de funcionamento da Usina São José.

“Eu tenho mantido muito contato com o doutor Evandro [Gaiad Fischer, gerente da Cetesb em Piracicaba]. Estão sendo feitos levantamentos e exigências de melhoria [para a usina]. Se não atendidos, ou dependendo daquilo que for apurado, na operacionalização da usina como um todo, a licença poderá ser cassada. Essa questão está sendo vista, só que é uma questão jurídica. Não dá, do dia para noite, ainda sem ter a certeza se o vazamento foi ocasional ou se foi doloso (com intenção), para cassar a licença. Eu entendo a indignação para quem pega meia dúzia de peixe e responde [na Justiça] e a usina ainda não respondeu. Mas vai responder, ainda que culposo. Culposo é uma pena até ridícula, e isso precisa mudar na lei. Mesmo no doloso, também acho muito baixo pela repercussão que causa, mas isso não é conosco, Ministério Público, isso é Assembleia, Câmara e Senado. E acho que essa Casa (Câmara de Vereadores de Piracicaba) também pode fazer moções nesse sentido e engrossar coros para aumento da penalidade nos crimes ambientais. Porque acaba sendo, de certa forma, compensador às vezes.”

O Grupo Farias foi procurado pela redação, mas até o fechamento desta edição, não se manifestou. O assunto é tão extenso e preocupante que a edição 231 do O Diário Piracicabano é dedicada exclusivamente à mortandade de peixes no Rio Piracicaba e desastres ambientais.

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