Obra da prefeitura no salto do Rio Piracicaba atende pedido da Associação de Canoagem; órgãos municipal e estadual não apresentam documentação para intervenção de grande impacto ambiental no leito do corpo d'água

A intervenção de retirada das pedras do leito do Rio Piracicaba flagrada em vídeo entre sexta e sábado, dias 30 e 31, com o trabalho de uma retroescavadeira é um pedido da Ascapi (Associação de Canoagem de Piracicaba) atendido pela gestão Luciano Almeida (PP). Em paralelo, o gabinete da vereadora Silvia Morales (PV/Mandato Coletivo) colheu documentos junto à prefeitura sobre a obra, mas nenhum deles confirmam o auto licenciamento da Simap ou eventual dispensa de outorga via DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica). Este órgão estadual foi contatado pela reportagem na segunda, dia 2, bem como a administração municipal e nenhum deles prestou quaisquer esclarecimentos até o fechamento desta edição.

Retroescavadeira foi filmada entre sexta e sábado passados e comoveu a opinião pública
(foto/crédito: reprodução/vídeo/web)

NOTA ASCAPI

Segundo um dos membros da associação, Denis Terezani, as intervenções entre a Ponte Pênsil e o Véu da Noiva – bem na boca do salto do rio – é num “pequeno trecho de 40 metros”.

“A Associação de Canoagem de Piracicaba - Ascapi solicita essas readequações desde 2000, com o objetivo de modelar uma raia de treinamento, assim como a  introdução de propostas ecoturísticas de aventura na natureza (boia cross, stand up, rafting, etc.), porém, somente agora a  prefeitura está promovendo o desassoreamento e manejo arbóreo (com destaque para a supressão de leucenas em ilhas formadas pelo assoreamento e detritos), esse macro projeto se estende do córrego do Enxofre (próximo ao Carrefour) até o córrego Itapeva (ponte do Mirante), logo, a nossa proposta se insere perfeitamente nesse trecho, sem ônus ambiental, por se tratar de um canal  construído artificialmente na década de 1960.”

DESASSOREAMENTO

A Ascapi está enganada quanto ao projeto de desassoreamento em curso via prefeitura. Em reportagem anterior, O Diário Piracicabano esmiuçou o memorial descritivo do edital: as intervenções serão executadas pontualmente na descarga dos córregos do Enxofre e Itapeva e na faixa de 1,5km do rio, a partir do Enxofre, sentido bairro Nova Piracicaba – ou seja, não há obras previstas para alterar, de qualquer forma, o leito do rio nas proximidades do seu salto.

Na mesma oportunidade desta reportagem, o engenheiro florestal do Núcleo de Apoio à Cultura e Extensão Universitária em Educação e Conservação Ambiental (Nace-Pteca) da Esalq/USP, Girlei Cunha, fez uma análise preocupante sobre o desassoreamento realizado em outro corpo d’água na cidade e apontou como grande o impacto desse tipo de intervenção.

“Essas ações de desassoreamento foram realizadas no Piracicamirim há um ou dois anos. Colocaram uma retroescavadeira dentro do ribeirão e foram retirando sedimentos e os colocando ao longo das margens (APPs), depois coletaram com caminhões e depositaram em local que desconheço. Aqui no caso do Piracicamirim, o resultado nas margens não foi bom, ficaram muito íngremes, com risco de erosão que tornará a ocorrer. Trataram o ribeirão como se fosse uma vala e não um rio. Não sou da área biologia de águas doces, mas suspeito que há impacto grande quando se remodela o leito fluvial”, avaliou.

DOCUMENTOS

Conforme a Semil (Secretaria Estadual de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística), a administração municipal recebeu permissão do Consema (Conselho Estadual do Meio Ambiente) em 10 de maio de 2024 para “exercer o licenciamento de médio impacto ambiental de âmbito local” – portanto, não está autorizada para obras de grande impacto, como avaliou o engenheiro florestal da Esalq.

Quanto ao apresentado pela funcionário da Secretaria Municipal de Obras (Semozel), identificado apenas como engenheiro Gesiel, ao gabinete de Silvia Morales, a auto licença emitida pela Secretaria Municipal de Meio Ambiental (Simap) se detém à “erradicação de vegetação exótica invasora em área urbana” e, no mesmo documento, as condições incluem, no item 2, que “Esta autorização está condicionada à obtenção da outorga de direito de uso emitida pelo DAEE, caso haja intervenção nos recursos hídrico”.

Mas, nada foi apresentado pela prefeitura para a intervenção no leito do Piracicaba e o mesmo Gesiel disse informalmente ao gabinete da parlamentar que foi pedida a dispensa da outorga junto ao DAEE – este documento também não foi apresentado. A vereadora Silvia está com um requerimento pronto para questionar a prefeitura sobre a regularidade da obra bem como o cumprimento dos processos dentro do previsto pelo Consema e Comdema (Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente).

Em tempo: diante da situação de ausência de previsão de obras no trecho do salto do Rio Piracicaba e da intenção de duplicação da avenida Alidor Pecorari, na Rua do Porto – que pode extinguir a casa de barcos utilizada pela Ascapi, o prefeito poderia ter acertado com a associação a tal intervenção pleiteada a fim de baixar a fervura quanto a perda da sede da canoagem. Também vale destacar a proximidade entre Luciano Almeida e o governador Tarcísio de Freitas (REP).

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